quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Conto - O Sacrificio

               Pedro era um homem bem sucedido nos négocios, meu amigo pessoal, sou seu parceiro financeiro desde que abrimos nossa primeira lojinha e vendemos nossa primeira bala. Ele não tinha uma vida pessoal lá muito boa, sem mulher, filhos, em um certo dia nossa empresa acabou indo para o buraco, eu fiquei super mal, mas ele quase morreu.
               Certo dia saímos juntos, entre um copo e outro de bebida, ele me fez uma promessa "Vou mudar, não tenho nada, nada mesmo, quero encontrar algo que faça minha vida valer à pena.". Logicamente pensei que se tratava de um delírio vinculado ao alcool, mas no dia seguinte uma ligação interrompeu meu sono, era Pedro me chamando para contar as novidades.
                -Estive conversando com um sujeito, ele me disse que estão pagando uma fortuna por essa flor - Ele me mostrou um retrato, era uma flor azul, com caule amarelado - É raríssima, eu sei exatamente o que fazer para pegar ela.
                 Pegamos meu carro e saímos rumo as montanhas, Pedro estava euforico, no meio do caminho ele me falava do tal sujeito, que ele era uma pessoa diferenciada e que transmitia uma serenidade incrível. Obviamente eu achava aquilo tudo uma baboseira, provavelmente era alguém o enganando aproveitando-se do momento de desespero ou ele estava delirando pelos calmantes em misto com o álcool, mas eu não negaria nada a ele.
                   Chegamos ao pé da montanha, agora iria começar a escalada, fomos pé por pé, centimetro por centimetro, rumo ao topo daquela montanha sem fim. Na primeira noite ao ar livre começei a me perguntar o que fazia ali com meu amigo louco, ao invéz de implorar por um emprego para algum de meus amigos, mas não iria sair do lado dele agora, mesmo aquela flor não existindo.
                    Pedro me parecia cada vez mais diferente, não estava mais tao abatido, estava sorridente, radiante, parecia que até seus cabelos brancos haviam sumido, eu não entendia o porquê disso, estávamos totalmente sujos, cansados e esfolados, o sacrificio por uma coisa tão idiota era incrivelmente estupido.
                    Passamos três dias junto naquela montanha sem comer direito, sem tomar banho, eu já estava totalmente exausto, até que uma hora no meio do terceiro dia ele me parou:
                    -Não sente nada diferente aqui? - seu olhar era esperançoso
                    -Sim, fome, frio, cansaço e muito estresse, algo mais? - falei ignorando sua expressão
                    -Você não entende mesmo, pensei que entenderia, volte para o carro, não tem nada a fazer aqui, me espere lá, logo vai entender - sua expressão passou de animação para frustração completa, eu explodi na hora
                     -Vou fazer isso, me mato aqui junto com voce e é assim que você me agradece? seu ingrato! - Bufei e sai trotando da presença dele.
                     No meio do caminho pensei se teria agido certo com ele, mas não havia tempo para arrependimentos. Demorei muito para chegar ao carro, parecia uma eternidade,quando cheguei peguei o pouco dinheiro que tinha e comi um bom lanche. Já estava cansado de esperar por Pedro, naquela altura já estava pensando se ele não havia morrido, ou se perdido na montanha.
                      Faziam dois dias que voltei para o vilarejo ao pé da montanha, e nem sinal de Pedro, estava me preparando para ligar para a policia, mas ele apareceu trotando em minha frente, estava com um pano nas mãos que envolviam algo, a tão misteriosa flor.
                      Quando vi aquela flor mal pude acreditar que ela existia mesmo, fiquei feliz, muito feliz, mas algo me decepcionou na mesma hora, ele simplesmente entregou a flor a uma mãe que chorava carregando uma criança desnutrida no colo.
                      Olhei pasmo a cena, não pude conter minha ira
                       -Você sabe o que você passou para pegar essa flor?, o que nós passamos para pegar essa maldita flor?, você simplesmente a entrega assim a uma qualquer, você tá louco?
                       -Você não entende mesmo caro amigo, nunca foi a flor, nem recuperar nosso patrimônio, foi o Sacrifício, alimentei meu corpo enquanto o sacrificava na escalada, alimentei nossa amizade quando a pus a prova e por fim alimentei meu espirito doando um bem inestimável para alguém que vai precisar muito mais do que eu.
                       Sua resposta me deixou sem palavras, aquele não era o Pedro que conheço. Ele claramente viu minha confusão e a recebeu com um sorriso.
                       -O estranho que me mandou procurar a flor, ele me disse que no fim meu espirito estaria tão alimentado que nem pensaria mais no dinheiro, me sacrifiquei por essa flor, e o mundo é feito de sacrificios, porém nenhum sacrificio é valido quando é só por si próprio, os sacrificios feitos para os outros são os que realmente contam, assim como a aranha sacrifica sua vida pelos seus filhos, os médicos sacrificam seu tempo pelos pacientes, e eu sacrifiquei minha integridade por aquela mulher que nem conheço. Agora vejo que o que perdi na vida não foi o dinheiro, mas a felicidade, espero que você veja isso também.
                         Não conseguimos recuperar nosso dinheiro, a mulher para qual Pedro deu a flor fundou uma ONG para ajudar crianças carentes do pobre vilarejo, Pedro agora anda por ai, sem rumo, junto a seu misterioso mentor, e eu, bem, ainda procuro muito ansioso pelo meu espírito.              

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