segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

A natureza contra o descaso


         
                Minha história? Bem ela ainda está acontecendo, já que a vida é um livro que uma nova página surge a cada dia. Mas o capítulo que estou protagonizando não é nada bom.
                Vamos por parte, há muitos anos meus pais resolveram se casar, não tinham nada, mas o sonho era ter uma casa onde pudessem construir uma família.
                Como não tinham dinheiro se ajeitaram em um canto qualquer. Certo dia neste “canto qualquer” veio um senhor, representante do prefeito da cidade, logo meus pais acharam que iam tirá-los de lá, mas ele não o fez, foi o contrário.  Convocou todos moradores do local e logo falou.
                “A prefeitura se importa com nossos moradores, não faríamos a atrocidade de tirá-los desse local, mas espero que entendam que para isso nosso prefeito precisa continuar, e precisa dos votos de vocês”
                Foi dito e feito, meus pais moravam na beira de um morro, e toda comunidade deu o voto para o candidato a prefeito em troca da morada ali.
                Voltando ao meu capítulo do livro de minha vida, meus pais não tiveram como me dar uma boa educação, abandonei a escola na sexta série, e comecei a ajudar meu pai como servente de pedreiro. Apaixonei-me por uma bela garota da vizinhança, nos casamos e passamos a morar na casa de meus pais.
                Minha vida ia muito bem, tivemos nosso primeiro filho, depois o segundo, mesmo não tendo luxo algum, eu estava feliz, amava profundamente minha família. Quando meu pai me contou como ele conseguiu nossa casa pedi para que Deus abençoasse nosso antigo prefeito pelo seu coração generoso.
                Mas desses últimos dias nunca vou esquecer, o capítulo começa quando tenho uma forte discussão com minha mulher na frente de meu filho de 5 anos, nossa discussão acordou a menorzinha que estava no berço. No auge da discussão disse “Me arrependo amargamente de ter me casado tão moço e ter perdido minha vida”, claro que não foi real, foi uma coisa que saiu da boca pra fora, mas quando brigamos fazemos de tudo para ferir nosso adversário seja física ou mentalmente.
                Sai de casa, fui para a cidade, não queria mais voltar pra casa naquele dia, nem a chuva forte que me fez cair algumas vezes no morro me fez parar. Fui prum bar lá no centro da cidade, quanto mais longe de casa ficasse era melhor.
                Depois de dormir fora de casa resolvi voltar, mas para onde? Cheguei no local onde minha casa sempre esteve e lá não havia nada, apenas lama, tudo estava soterrado não acreditei ao ver aquilo, me atirei no chão chorando com muita força, parecia que algo ruim estava apertando meu coração e brincando com ele como se fosse um saco de pancadas. Minha vista começou a embaçar e a última coisa que lembro foi de um dos homens envolvidos nas buscas me socorrer.
                Acordei em uma tenda de socorro improvisada com um dos voluntários nas buscas sorrindo e dizendo
                “Nem tudo se perdeu”, ela me entregou minha filha menor, sobreviveu por milagre, trouxe com ela algumas recordações como álbuns de fotos.
                Mas minha vida estava perdida, minha mulher e meu filho mais velho se foram, assim como meus pais e a maior parte dos vizinhos, só não me atirei daquele morro pelo pequeno milagre que agora vai ter que crescer sem mãe e avós, nem irmão.
                Até agora me pergunto de quem é a culpa, nossa por invadir um lugar de risco? Mas meus pais nem sabiam o que é isso, e depois nem tinham mais aonde ir, não podiam me criar na chuva. Mas a imagem do prefeito que prometeu a morada não me sai da cabeça, e agora digo para todas autoridades, Deus abençoe-os , porque um pouco do sangue de cada morto está nas mãos de vocês.

Nenhum comentário:

Postar um comentário